domingo, 15 de setembro de 2013

CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES

Teoria Quinária de Pontes de Miranda foi prevalente durante muitos anos, mais precisamente, desde o advento do CPC de 1973 até o ano de 2005, quando a Teoria Trinária passa a ser majoritária.

Para Pontes de Miranda, existiam cinco espécies de demanda no processo civil e essas cinco espécies surgiram do seguinte raciocínio: em sua teoria, no CPC de 1973, Pontes de Miranda identificou que haviam demandas que pleiteavam o direito de prestação, sendo que dessas identificou três tipos de pretensão, quais sejam, (i) dar coisa, (ii) pagar quantia, e (iii) fazer e não fazer.

Tais pretensões podem se configurar em juízo com uma limitação: sempre que se estiver desenvolvendo prestações, veiculando pretensões, haverá um prazo exigido para que tal situação seja pleiteada. Trata-se do prazo de prescrição.

DEMANDAS CONDENATÓRIAS:

Pontes de Miranda identificava ainda tais demandas como uma grande espécie geral, as chamadas condenatórias lato senso. As condenatórias lato senso, no CPC/73, via de regra, seriam cobradas após um processo de conhecimento, onde seriam delimitadas, e iriam gerar um processo de execução autônomo. Então, a regra era que as demandas condenatórias lato senso tivessem um processo de execução autônomo. Quando isso acontece, tem-se a condenatória propriamente dita, ou condenatória estricto senso.

Havia, contudo, procedimentos especiais em que não exigiam uma execução de sentença futura para que a demanda pudesse ser satisfeita, ou seja, em 1973 se tinha procedimentos especiais que, dentro da fase cognitiva original se viabilizava a satisfação da pretensão da parte. Esses procedimentos geravam duas espécies:

a) Execução direta: feita dentro da fase cognitiva. É o caso da ação possessória. Pontes de Miranda chamava tais situações de ações executivas lato senso. O judiciário obriga o devedor a cumprir o que ele deve, ele diretamente retira do imóvel a pessoa e coloca seu real possuidor.

b) Execução indireta: ocorre quando o judiciário determina que certa autoridade coatora faça ou deixe de fazer alguma, exemplo clássico do mandado de segurança. São casos chamados de execução indireta porque o judiciário não se substitui a autoridade coatora para que ela cumpra determinada coisa ou deixe de fazer algo. O judiciário simplesmente determina que ela assim o faça, sob penas da lei. Para Pontes de Miranda, tal situação configurava uma nova espécie de demanda, a qual dava o nome de mandamental.

Em 1994, a lei nº 8.952 fez com que as obrigações de fazer e não fazer passassem a ser cumpridas dentro do processo original.

Em 2002, com o advento da lei nº 10.444 leva as obrigações de dar coisa para dentro do processo cognitivo. Não mais seria necessário promover um processo executivo autônomo em tais circunstâncias.

Com a lei nº 11.232 de 2005, as obrigações de pagar quantia passaram também a ser cobradas dentro do processo original através da fase de cumprimento de sentença. Assim, a partir de 2005 o jurídico passa a ser esvaziado da ação condenatória estricto senso, porque não se tem mais, em regra, procedimento de execução de título judicial autônomo.

A doutrina, então, a partir de 2005, entende que é muito mais fácil hoje se falar que tudo não passa de uma ação condenatória que, em determinadas situações terá atos de execução direta, executivas lato senso, e atos de execução indireta, conhecidas como atos mandamentais. Em suma, o que eram 3 espécies no CC/16, passa a ser considerada como uma só espécie: a condenatória lato senso.

A ação condenatória lato senso permite hoje no processo civil que atos executivos lato senso sejam praticados por meio de instrumentos como a busca e apreensão; permite também que atos mandamentais sejam executados utilizando-se das astreintes, dentre outras possibilidades.

AS DEMANDAS CONSTITUTIVAS (OU DESCONSTITUTIVAS):

Tais demandas buscam, quando positivas, criar relações jurídicas ou fatos; e, quando negativas, extinguir relações jurídicas ou fatos. A demanda constitutiva ou desconstitutiva vai sempre exercer esse poder potestativo, ou seja, o poder de criar ou extinguir uma relação jurídica ou fato da vida. A demanda constitutiva ou descontistutiva, como advém de um direito potestativo, não está veiculando pretensões e por isso não prescrevem. Tais demandas, constitutiva ou desconstitutiva, poderá ter um único prazo extintivo, qual seja, a decadência. Exemplo: se a parte quer desconstituir uma sentença arbitral, terá um prazo decadencial de 90 dias a contar da decisão. Esse prazo de 90 dias é um prazo extintivo de um direito potestativo de desconstituição de um título de sentença arbitral. Ressalta-se, entretanto, que a decadência nem sempre será presente no direito potestativo. Pode acontecer de se ter um direito potestativo sem prazo extintivo previsto, caso em que tal direito não decairá. Exemplo: direito potestativo ao divórcio.

As demandas constitutivas também não carecem de execução, pois já possuem eficácia de pronto, produzindo os efeitos pretendidos a partir da decisão. Não há possibilidade, nem necessidade, de se executar uma sentença constitutiva ou desconstitutiva.

Em suma, tais demandas não prescrevem, eventualmente podem decair, e não precisam ter a sentença executada, pois emana todos os efeitos possíveis de pronto.

DEMANDA PURAMENTE DECLARATÓRIA:

Todo processo judicial, em certa medida, declara alguma coisa. A demanda condenatória tem ao final a declaração positiva ou negativa de um crédito. A demanda constitutiva/desconstitutiva tem ao final a declaração de criação/extinção de uma relação jurídica ou fato. Contudo, a demanda puramente declaratória serve unicamente para declarar a existência ou não existência de um fato ou relação jurídica. Exemplo: ao se ajuizar uma ação de declaração de união estável, o que se quer, tão somente, é que o Estado afirme que, diante das circunstâncias legais apresentadas, de fato a parte vive em união estável, e que essa união estável terá suas consequências jurídicas no futuro. Assim, em princípio, as ações declaratórias, sejam elas positivas ou negativas, não carecem de execução. Contudo, posicionamento moderno do STJ aduz que quando a declaratória for de existência de crédito haverá, sim, execução.


Dando prosseguimento, as demandas puramente declaratórias também não estão sujeitas a prazo extintivo, já que o que se pretende é a declaração positiva ou negativa da existência de determinado fato ou relação jurídica.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

CONDIÇÕES DA AÇÃO

LEGITIMIDADE PARA A CAUSA:

Legitimidade para o processo é o poder jurídico de estar no polo passivo ou ativo de um processo. Via de regra, esse poder vai ter relação com o interesse jurídico que a parte tiver na demanda.

A legitimidade no processo civil pode se dividir em duas subespécies:

a) Legitimidade Ordinária: consiste no poder jurídico de estar num polo processual, tanto ativo quanto passivo, pleiteando, em nome próprio, interesse próprio. É a regra.

b) Legitimidade Extraordinária: consiste na possibilidade, autorizada/determinada por lei, de um terceiro demandar em nome próprio interesse alheio. Tal situação também é conhecida como Substituição Processual.

Obs.: Substituição Processual é diferente de Representação Processual. Esta ocorre, por exemplo, quando a parte é absolutamente incapaz e necessita de um representante para ir à juízo pleitear seu direito. Nesse caso o representante não está pleiteando direito de terceiro em nome próprio, mas em nome do terceiro. Já na Substituição Processual, ao contrário, o substituto está a pleitear o direito de terceiro em nome próprio autorizado por lei.

INTERESSE DE AGIR:

Primeiramente é preciso entender o que vem a ser a Causa de Pedir. Há duas espécies: a) Causa de pedir remota; e b) causa de pedir próxima.

A causa de pedir remota é um fato da vida ou  um negócio jurídico que, em princípio, não irá gerar um processo. Exemplo: se o indivíduo vai a um determinado lugar procurando um imóvel para alugar, aluga o imóvel celebrando um contrato, tem-se uma causa de pedir remota. A locação do imóvel e o contrato não irão gerar, a princípio, consequências jurídicas a serem pleiteadas em juízo. A locação de um imóvel pode transcorrer durante todo o período de vigência do contrato sem ter que gerar processo. Agora, existe um determinado momento, existe uma incidência do direito na causa de pedir remota, que pode gerar pleitos.

É nesse momento, onde o direito incide sobre o negócio jurídico gerando consequências, é que se verifica a chamada causa de pedir próxima. Exemplo: o indivíduo tem um contrato de aluguem que está tramitando sem problemas, só que ele se torna inadimplente e, nesse momento, o direito incide na causa de pedir remota gerando consequências, quais sejam, a possibilidade de uma ação de despejo, a possibilidade de cobrança dos alugueis. Nesse fenômeno, a causa de pedir remota é o contrato de aluguel, esse contrato que não iria ao judiciário aprioristicamente. Quando o indivíduo se tornou inadimplente, passou a incidir na hipótese da chamada causa de pedir próxima, e a causa de pedir próxima gera frutos, e tais frutos são as consequências jurídicas, e essas são chamadas de pedidos. A causa de pedir próxima do indivíduo, inadimplência, gera os seguintes pedidos por parte do credor: a) despejo; e b) cobrança de aluguéis. Esse conceito de causa de pedir próxima e remota exige três elementos, três circunstâncias, pra se viabilizar como possível, quais sejam: i) necessidade; ii) utilidade; e iii) adequação.

Necessidade seria a situação imperiosa de que o indivíduo só vai poder buscar aquilo que quer pelo judiciário. Então, a necessidade faz com que não se possa obter o que se quer sem um processo judicial. Se, eventualmente, o indivíduo tem à disposição a possibilidade de, por outro meio que não o judicial, obter um bem da vida que se quer, terá a configuração da ausência de interesse de agir pela inexistência de necessidade.

A utilidade, por sua vez, configura-se na possibilidade de o processo dar ao indivíduo aquilo que ele pleiteia. Se o indivíduo vai a juízo buscar determinado veículo, necessariamente esse veículo deve ainda existir. Se busca um determinado terreno, este deve estar localizado e ser descrito como existente .

Por fim, a adequação. Diz respeito ao processo ser adequado, suficiente para o pleito que se quer obter.

Se preenchidos os três requisitos, tem-se configurado o interesse de agir.

Há, entretanto, que se trazer à baila duas questões:

- Se tenho qualquer defeito no interesse de agir necessidade e o interesse de agir utilidade, o processo será extinto por carência de ação.
- Se, por outro lado, tiver dificuldade em demonstrar que o processo é adequado naquele procedimento específico para o que se pretende
, o magistrado tem o poder, a possibilidade, de converter o procedimento para aquele que seria o adequado, desde que a parte colabore fornecendo os elementos de que o juiz necessite.

POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO:

O pedido tem que possuir guarida legal, ou seja, não haverá possibilidade jurídica do pedido, por exemplo, em pleito que vise uma ordem para matar alguém, ou de usucapião de terreno na lua.

Essa possibilidade jurídica do pedido, que efetivamente hoje se reserva na doutrina pura de Liebman a essas hipóteses estapafúrdias, deverá ser abandonada no novo CPC, como o fez o próprio Liebman no CPC italiano.


Há doutrinadores, entretanto, como Dinamarco, que tentam salvar a possibilidade jurídica do pedido transformando-a em possibilidade jurídica da demanda. E o que seria a possibilidade jurídica da demanda? Seria a possibilidade de o juiz enfrentar a concordância dos três elementos do processo como direito, então aí, nesse caso, o juiz iria verificar se a parte era legalmente possível, se a causa de pedir era legalmente possível e, aí sim, finalmente, se o pedido era legalmente possível. O exemplo clássico é o da dívida de jogo. O que é impossível é a causa de pedir remota, a dívida de jogo, pois a causa de pedir próxima, o inadimplemento e o pedido à cobrança seriam, em tese, desimpedidos. Para Dinamarco essa é uma impossibilidade jurídica da demanda por causa de pedir juridicamente impossível, o que a doutrina e a jurisprudência acolhem em boa parte. Assim, se em algum concurso aparecer a expressão possibilidade jurídica da demanda, certamente estará pautado na doutrina de Dinamarco.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

TEORIAS DA AÇÃO

Teoria Civilista ou Imanentista (Teoria clássica/civilista)

Defendida por Friedrich Carl von Savigny, surgiu nos primórdios da estruturação do acesso à justiça, no início do judiciário como se conhece hoje. Foi a primeira teoria a tentar explicar o direito material e o direito de ação. Na época o que se entendia era que o processo civil não seria uma ciência em direito autônoma e sim uma mera consequência do direito material que se tinha. Ela pressupõe que o direito material e o direito de ação são a mesma coisa, quer dizer, o direito de ação seria imanente (inerente) ao direito material, como resposta à sua violação. Em outras palavras, só se tinha o direito de ação se houvesse antes um direito material estabelecido, ou seja, o direito de bater às portas do judiciário para se cobrar um crédito só existiria se antes houvesse de fato o direito material a tal crédito. O direito de ação era uma consequência do direito ao crédito. Essa teoria, em suma, não vê autonomia do processo civil diante do direito original que a parte detinha.   Porém, ela não foi capaz de explicar casos como da ação meramente declaratória, em que não há violação de direito material e tudo que o autor deseja é a declaração de um direito ou uma situação para que seja oficializado. Exemplo: divórcio consensual, onde sequer há processo. Ainda encontrou dificuldades para explicar a ação declaratória negativa, onde o autor pede que seja emitida uma sentença que negue relação jurídica ocorrida entre ele e o pólo passivo, teoria de Adolph Wach.

Teoria do Direito Público

Na Alemanha, estabeleceu-se, na metade do século passado, uma polêmica que se tornou famosa, entre Windscheid e Muther sobre a actio romana no seu desenvolvimento até a ação no direito contemporâneo. A polêmica teve a virtude de pôr em destaque e separados por conteúdos próprios, o direito e a ação.

Muther, combatendo algumas idéias de Windscheid, distinguiu direito lesado e ação nitidamente.

Segundo sua concepção, a ação consiste no direito à tutela do Estado, e que compete a quem seja ofendido em seu direito.

" A ação é um direito contra o Estado para invocar sua tutela jurisdicional. É, pois, um direito público subjetivo, distinto do direito cuja tutela se pede, mas tendo por pressupostos este direito e sua violação" ( MOACYR, p.149 ).

Desta forma, distinguia-se o direito subjetivo material, a ser tutelado, do direito de ação, que era direito subjetivo público.

Teoria Concreta

A teoria concreta ficou explicitadamente correta mesmo em 1885, defendida, entre outros, por Adolph Wach e por Bülow, entendia o direito de ação como dependente da procedência da ação, então passou-se a ter condições para propositura da ação.

A existência de um direito violado ou ameaçado, legitimidade de interesse, não poderia ser violação ou ameaça de direito de outrem e a possibilidade jurídica do pedido, determinados dentro do direito vigente. O do direito material é independente do direito de ação, porém andam juntos.

O principal problema na teoria concreta é não explicar o direito do réu, por exemplo, de solicitar a apelação, se não pode propor a ação, visto que seu pedido não foi procedente, tornando assim a ameaça ou violação de seu direito imaginário. Sendo assim, deu-se espaço a uma nova concepção:

Teoria Abstrata da Ação

Com diversos criadores concomitantemente: Giuseppe Chiovenda, Degenkolb, Plósz e Rocco, segundo eles, o direito de ação independe da materialidade do direito, basta que seu interesse seja juridicamente tutelado e poder-se-á ter a ação, afinal o primeiro direito é à jurisdição do Estado, que se compromete a defender os interesses do indivíduo para que esse não o exerça pela própria mão, sendo este o primeiro direito; o segundo seria sua pretensão, sendo assim, o direito de ação só requer a tutela daquela pretensão pelo Estado para que o indivíduo requeira apreciação direcionada ao juiz, como dita Francesco Carnelutti. Já o uruguaio Eduardo Juan Couture, elenca a ação como direito de petição, assegurada constitucionalmente. A teoria abstrata, que trata da ação como o direito a uma pronunciação de sentença de mérito, contra ou favorável. Assim exposto, o direito de ação e o direito material tomam caminhos diversos. O direito de ação passa a ser visto como um direito autônomo e abstrato, independente de procedência ou não do processo.

Teoria Eclética

A teoria eclética apresenta a ação como exercício do Estado-juiz, apresentando a ida ao judiciário uma obrigação para dirimir conflitos. Para Pekelis a ação possui um direito subjetivo de fazer agir o Estado, então ação não é o direito de agir e sim o de provocar o Estado a agir, o que torna o interesse ou ameaça de interesse um efeito causado pelo direito individual de fazer mover-se o Estado. Nosso direito positivo sofreu influência de Enrico Tullio Liebman, processualista italiano, inspirador do Código de Processo Civil de 1973, O autor define ação como instrumento, um poder igualado ao querer do Estado de assegurar a justiça, poder esse que pode ser exercido usando o direito material, logo atribui-se natureza constitucional de um Estado civilizado. Para Liebman, a existência da ação depende de determinadas condições. Essa doutrina mais completa do que se opõe a abstrata, por isso, não é comum que a arrole como completiva abstrata. Para esta teoria a ação é incondicionada, ela existe sempre.

Teoria da Asserção ou Prospecção

Para essa teoria, as condições da ação trazidas pela Teoria Eclética, em regra, devem ser verificadas pelo magistrado quando recebe a petição inicial e logo após a apresentação da defesa. Nesses dois momentos, se o magistrado identificar defeito em qualquer dos requisitos, declarará carência de ação e extinguirá o processo sem resolução de mérito.

Agora, se o magistrado receber a petição inicial, enfrentar a contestação e sanear o processo, a partir do saneamento do processo, em regra, não se fala mais em carência de ação. Após o saneamento ocorrem duas situações: a) resolução de mérito; ou b) reconhecimento da ausência de pressupostos processuais.

Há, contudo, que se lembrar que pode acontecer, excepcionalmente, de o processo apresentar modificações fáticas supervenientes. Exemplo: sujeito ajuizou uma demanda relacionada a saúde, obteve o remédio, num primeiro momento; teve o tratamento concedido; contudo, no meio do processo vem a cura daquela doença subitamente e  o indivíduo não mais necessita do medicamento ou tratamento. Nesse caso, houve a modificação fática durante o processo que levou à revisão das condições da ação. Assim, o juiz reconheceria a carência de ação superveniente por ausência de interesse de agir.

Observe: o que possibilitou que  o magistrado a revisse as condições da ação? Modificações fáticas nos altos que alteram os elementos do processo.

A Teoria da Asserção permite, hoje, que a Teoria Eclética Abstrata se mantenha vigente e é a teoria utilizada pelos tribunais nas resolução das questões apreciadas em nosso processo civil brasileiro.


Teoria Geral do Processo - Ação e Elementos da ação

DA AÇÃO
Trinômio: ação, jurisdição e processo.
Ação – provoca a jurisdição;
Jurisdição – Poder dever do Estado de resolver conflitos;
Processo – Complexo de atos no sentido de resolver os conflitos.
NATUREZA JURÍDICA DA AÇÃO
Há distinção entre a ação e o direito subjetivo material por ela invocado. O processo tem por finalidade a composição da lide, não o interesse em lide.
1 - Tanto é assim que existem as ações declaratórias, em que o fundamento é a simples declaração da existência ou não de um direito e a existência de ações sem direito, que são as julgadas improcedentes.
2 – A ação não está condicionada ao direito subjetivo, ao contrário da teoria da ação no sentido concreto, vez que a ação julgada improcedente redunda em ação, que não deixou de ser, não condicionada a qualquer direito subjetivo material.
3 – A orientação tradicional de conferir a ação contra o adversário, não progrediu. A ação se constitui como direito à prestação jurisdicional do Estado, para tutela de um interesse em abstrato, juridicamente protegido. De outro modo não poderia ser, vez que o Estado reservou para si este Direito.
CONCEITO DE AÇÃO –
O conceito de ação traz à idéia os indivíduos, com seus bens, direitos, e o Estado na sua função jurisdicional.
Os indivíduos, de regra, gozam pacificamente de seus bens, exercendo normalmente seus direitos.
No entanto, às vezes ocorre que o interesse juridicamente protegido de um é ameaçado e mesmo violado por outrem. Assim, há interesses que se colidem, despertando, da parte de um, outro interesse, divergente.
Assim, ocorrendo o conflito e impossibilidade da autodefesa, a não ser em casos especialíssimos e previstos em lei, o Estado, que reservou para si a função jurisdicional, tem que atuar. Deste modo, surge para o prejudicado o direito de fazer valer a pretensão por via do Estado.
Esse direito, de caráter público, pois diz respeito ao exercício de função pública e tem por sujeito passivo o próprio Estado, é o direito de ação.
Tal direito se confia na provocação do exercício da jurisdição. Assim, ao direito de ação corresponde o dever da prestação jurisdicional.
Desse modo, a ação dirigida contra o Estado alcança o demandado, sujeitando-o a comparecer para se defender. E, por força do poder de sujeição, inerente à função jurisdicional, se estabelece a bilateralidade do processo, o qual serve de instrumento do exercício da função com o fim disciplinado pelo Estado.
EM SÍNTESE:
A AÇÃO é direito subjetivo público, distinto do direito subjetivo privado invocado, ao qual não se pressupõe necessariamente, e, pois, neste sentido, abstrato; é genérico, porque não varia, é sempre o mesmo; tem como sujeito passivo o Estado, do qual visa a prestação jurisdicional num caso concreto. É o direito de pedir ao Estado a prestação de sua atividade jurisdicional num caso concreto.
CONDIÇÕES DA AÇÃO
Embora autônomo e abstrato, o direito de ação está instrumentalmente ligado a uma pretensão sobre a qual deverá incidir a prestação jurisdicional invocada.
Condições da ação os elementos e requisitos necessários para que o juiz decida o mérito da pretensão, aplicando o direito objetivo a uma situação contenciosa".
Assim, a sentença de mérito só será realizada caso a ação tenha obedecido a três critérios previstos no nosso CPC.
Caso a ação obedeça a esses critérios ela terá obtido a tutela jurisdicional e, então, haverá o julgamento do mérito da questão. Se a ação não obedecer a tais situações então não haverá julgamento do mérito da prodedência ou improcedência do pedido formulado pelo autor.
As três condições para admissibilidade pelo poder judicial são: interesse processual ou de agirlegitimidade das partes e possibilidade jurídica do pedido.
A princípio deve o juiz examinar questões preliminares, antes da avaliação do mérito, que dizem respeito ao próprio direito de ação e à existência e regularidade da relação jurídica processual (pressupostos processuais).
Caso haja carência de um ou mais das condições da ação então o juiz ficará impedido de julgar o mérito da ação.
Aspectos Gerais das Condições da Ação
As condições da ação não são requisitos para a existência da ação. São requisitos estabelecidos para o exercício regular da ação pois, se não preenchidos, impedem a condução do processo para a avaliação do mérito.
São razões de economia processual que determinam a criação de técnicas processuais que permitam o julgamento antecipado, sem a prática de atos processuais inteiramente inúteis ao julgamento da causa.
As condições da ação nada mais constituem que técnica processual instituída para a consecução deste objetivo.
Mesmo diante da ausência de uma condição da ação, haverá atividade jurisdicional pois além do direito a um julgamento da lide, todos possuem o direito a uma decisão sobre a possibilidade de ser decidida a própria lide.
Condições da Ação
Na sistemática de nosso CPC, existem os pressupostos processuais e as condições da ação, que são requisitos de admissibilidade para o julgamento do mérito.
Apreciar o mérito ou a lide significa decidir a respeito do pedido do autor, julgando-o procedente ou improcedente.
O princípio da admissibilidade é formado pelos pressupostos processuais e as condições da ação.
Deve-se verificar se a relação jurídica processual instaurou-se e evoluiu regularmente (pressupostos processuais), se a ação foi exercida regularmente diante do caso concreto (condições da ação), ainda que decida a respeito destas questões somente na sentença.
Estas questões são as preliminares em relação à questão de mérito. A admissibilidade impõe-se como uma espécie de mecanismo de filtragem, separando, dentre os pedidos que batem às portas do Judiciário, aqueles que se apresentam como passíveis de exame substancial dos que podem, de pronto ser descartados, já por questões respeitantes à existência e validade do processo, apenas, através do qual se desenvolve a ação, já por motivos que prenunciam ser esta mesma insuscetível de levar a uma decisão de fundo sobre o direito invocado.
O CPC, no art. 267, IV, refere-se aos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo e no inciso VI refere-se às condições da ação, e, no art. 269, I, trata do julgamento do mérito ou do pedido do autor.
Vamos às 3 condições da ação.
Legitimidade das partes
Diz respeito à titularidade a ser observada nos pólos ativo e passivo da demanda.
Segundo o artigo 6º do CPC, o autor deve ser o titular da situação jurídica afirmada em juízo e a outra parte legítima no processo, o réu, é preciso que haja relação de sujeição à pretensão do autor.
Conforme preceitua o art. 3º do CPC, "para propor ou contestar uma ação é necessário ter interesse e legitimidade". Assim, somente os titulares da relação jurídica de direito material deduzida em juízo é que podem demandar.
Na ação de despejo, v.g., são partes legítimas o locador (ativa) e o locatário (passiva), pois figuram na relação jurídica de direito material (contrato de locação) trazida a juízo.
É necessário, também, que exista um vínculo entre autor da ação, objeto da ação e réu. Mesmo que não exista a relação jurídica pelo autor, há de existir pelo menos alguma relação jurídica que permita ao juiz identificar esta relação entre autor, objeto e réu.
O autor é o pólo ativo, é aquele que se diz titular de direitos e requer proteção da justiça, ao passo que o réu, é o pólo passivo, aquele a quem caiba cumprir obrigações decorrente do pedido ou objeto da ação.
Concluindo, a legitimidade é uma atribuição específica para agir concretamente, conferida exclusivamente pelo direito objetivo aos titulares da lide, podendo, às vezes, ser conferido a outras pessoas que não integram diretamente a relação jurídica afirmada em juízo.
Em regra, só está autorizado a demandar o titular do interesse deduzido em juízo. Nesse caso, fala-se em legitimação normal ou ordinária, hipótese em que as partes do processo coincidem com as partes da relação substancial.
Todavia, excepcionalmente, a lei permite que alguém atue em nome próprio para preservar direito alheio, ou seja, concede legitimidade à pessoa que não é titular do direito material. É a hipótese de legitimidade extraordinária ou anômala, que segundo Liebman "é o direito de perseguir em juízo um direito alheio". (125)
A legitimidade extraordinária é concorrente quando a lei autoriza tanto o legitimado extraordinário quanto o ordinário a demandar, isoladamente, ou em conjunto. É o que ocorre, v.g., "na ação de investigação de paternidade, em que o titular do interesse ao reconhecimento da paternidade é legitimado ordinário e o Ministério público é legitimado extraordinário concorrente". (126)
Alexandre Freitas Câmara aponta, ainda, uma terceira espécie de legitimação anômala, a legitimidade extraordinária subsidiária, que ocorre "quando o legitimado extraordinário só pode demandar na omissão do ordinário" (127). Ex.: qualquer credor pode propor ação revocatória se o síndico não o fizer.
Grande parte dos processualistas, arraigados nas lições de Chiovenda, consideram substituição processual e legitimação extraordinária como expressões sinônimas. Contrapondo esse pensamento, vale ressaltar o entendimento de Alexandre Freitas Câmara, para quem a substituição processual só ocorre quando, em um processo, o legitimado extraordinário atue em nome próprio, na defesa de interesse alheio, sem que o legitimado ordinário atue com ele. (...) Em outros termos, só ocorrerá substituição processual quando alguém estiver em juízo em nome próprio, em lugar do (substituindo) legitimado ordinário. (128)
A legitimação extraordinária tem representado papel de extrema relevância nos dias atuais, principalmente no que concerne ao amparo dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos. Basta observar o conteúdo da lei de Ação civil pública (nº 7.347/85), o mandado de segurança coletivo (art. 5º, LXX, CF) e as ações coletivas do Código de defesa do consumidor (Lei nº 8.078/90).
Interesse de agir
O CPC brasileiro determina, em seu art. 3° , que "para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade".
Alguns autores consideram inapropriado o termo "interesse de agir" por ser destituído de técnica e precisão.
Agir pode ter significado processual e extraprocessual, ao passo que interesse processual significa, univocamente, entidade que tem eficácia endoprocessual.
O interesse processual é composto do binômio necessidade e utilidade e sem eles não haverá tutela jurisdicional do Estado de direito.
Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando esta tutela pode trazer alguma utilidade prática.
Verifica-se quando o direito estiver sido ameaçado ou violado. Assim, se o autor mover a ação errada ou utilizar-se do procedimento incorreto o procedimento não lhe será útil.
Ex: MS para cobrança; ação de cobrança de cheque, etc.
O interesse processual nasce, portanto, da necessidade da tutela jurisdicional do Estado, invocada pelo meio adequado, que determinará o resultado útil pretendido, do ponto de vista processual.
Artigo 295, V. – Instrumentalidade.
O interesse processual consiste na utilidade do provimento jurisdicional solicitado. Essa utilidade depende da presença de dois elementos: necessidade de tutela jurisdicional e adequação do provimento solicitado.
Necessidade - basta a impossibilidade do autor fazer valer seu interesse através do emprego de meios próprios. Essa necessidade tanto pode decorrer de impossibilidade legal (separação judicial, p. ex.) quanto da negativa do réu em cumprir espontaneamente determinada obrigação ou permitir o alcance de determinado resultado (devedor que não paga o débito no vencimento). (132)
Não é suficiente, porém, que a atuação jurisdicional seja necessária para que o interesse processual se configure. Faz-se mister, ainda, que haja o interesse-adequação, isto é, a utilização do método processual adequado à tutela jurisdicional almejada.
Assim, p. ex., o cônjuge que pretenda desfazer seu casamento em razão de ser o outro adúltero deverá mover ação de separação judicial, e não ação de anulação do casamento. (133)
Possibilidade jurídica do pedido
Há possibilidade jurídica do pedido quando o ordenamento jurídico admite, em tese, a pretensão deduzida pelo autor.
A possibilidade jurídica estará preenchida se o direito material não veda o exame da matéria pelo poder judiciário.
Por exemplo, "A" propõe em face de "B" uma ação de cobrança, cujo pedido é a condenação do réu no pagamento de certo valor monetário oriundo de dívida de jogo.
Destarte, não basta que o pedido seja juridicamente possível, mas também seu fundamento. Para Alexandre Freitas Câmara, o termo mais adequado seria "possibilidade jurídica da demanda". (137)
Arruda Alvim, assim se expressa sobre a possibilidade jurídica do pedido "é instituto processual e significa que ninguém pode intentar uma ação sem que peça uma providência que esteja em tese (abstratamente), prevista no ordenamento jurídico, seja expressa, seja implicitamente".
Existem duas opiniões na doutrina que afirmam por um lado que se houver previsão da providência requerida, então sempre haverá possibilidade jurídica do pedido; e por outro lado se não existir vedação expressa quanto àquilo que se está pedindo em juízo então haverá possibilidade jurídica do pedido.
No entanto, temos diferentes possibilidades de pedir caso estejamos diante de direito público ou de direito privado.
Para o direito privado, é suficiente a inexistência de vedação expressa no ordenamento jurídico quanto à petição trazida ao juiz pelo autor. Para o direito público, só se tem permitido aquilo que a lei expressamente autorizar, não se permitindo fazer pedido sobre o que a lei não fizer qualquer referência.
Em vista do exposto somos partidários de uma mistura das duas correntes de opinião devido ao diferente tratamento dado pelo direito privado e pelo direito público.
Saliente-se que na hipótese de inexistir previsão legal para o pedido do autor, pode-se segundo Arruda Alvim procurar nas súmulas emitidas pelos Superiores Tribunais buscar uma proteção jurídica para o pedido. Humberto Theodoro assim se pronuncia sobre a possibilidade jurídica do pedido "exigência de que deve existir, abstratamente, dentro do ordenamento jurídico, um tipo de providência como a que se pede através da ação".
Sobre a impossibilidade jurídica do pedido é exemplo clássico relembrar que no caso de dívida de jogo não se pode requerer a proteção jurisdicional para cobrar tal dívida já que é proibido pelo ordenamento jurídico.
Cabe observar que embora a ação de cobrança, considerada estritamente, seja possível em nosso sistema não o será se tiver como causa do pedido a dívida de jogo.
- ELEMENTOS DA AÇÃO –
Cada ação proposta, considerada em particular, tem certos elementos próprios que a identificam, servindo para isolá-la e distingui-la das demais.
Conforme já vimos, são 3 os elementos: partes; objeto e causa de pedir.
CPC, 282, II, III e IV.
CLT 840, § 1º
CPP, 41.
Faltando qualquer desses elementos, a petição inicial será liminarmente indeferida.
Quem age formula uma pretensão a um bem em relação a outrem, pedindo ao Estado, a quem a justifica, uma providência jurisdicional, que a tutele.
Desses dados, que se encontram em todas as ações, resulta que são elementos da ação:
1 – partes – sujeitos da lide;
2 – Pedido, a providência jurisdicional solicitada quanto a um bem;
3 – Causas de pedir, as razões que suscitam a pretensão e a providência.
COMO VIMOS, TAL IDENTIFICAÇÃO É IMPORTANTE, POSTO QUE NA IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS DA AÇÃO, EXISTEM OUTROS TEMAS LIGADOS, COMO CONEXÃO, COISA JULGADA, LITISPENDÊNCIA, ETC. Vamos a cada um.
Das Partes
São as pessoas que participam do contraditório perante o Estado-Juiz.
O direito de ação é atribuído ao titular de um interesse em conflito com o interesse de outrem. Por meio da ação, um pretende a subordinação do interesse do outro ao seu, ao qual este resiste.
Assim, na ação há dois sujeitos, que são os mesmos da lide a que visa compor, um sujeito ativo, autor, e outro sujeito passivo, réu, ao quais são abrangidos pela denominação jurídica de partes.
Da Causa De Pedir
O autor, quando vai a juízo, narra os fatos, apresenta sua exposição.
Assim, apresenta os fundamentos de fato e os fundamentos de direito.
Os fundamentos de fato compõem a causa de pedir próxima. É o inadimplemento, a ameaça, a lesão, enfim, é aquilo que autoriza o autor vir a juízo. É a violação do direito que se pretende proteger.
Assim, o direito, abstratamente, não pode ser fundamento imediato, não justifica o ingresso em juízo, é necessário fundamentar em que o direito foi ameaçado ou violado.
Os fundamentos de direito, causa de pedir remota, é aquilo que autoriza o pedido. É a fundamentação que o direito dá ao autor.
Pedido – Sinônimo de pretensão, mérito, objeto
Não se justifica o ingresso de alguém em juízo que não para pedir ao judiciário uma medida, um provimento.
Seria a indenização; os alimentos; a separação; a anulação do contrato, etc.
O regime jurídico do pedido está contido no CPC entre os artigos 286 a 294.
Deve ser explícito, pois interpretado restritivamente – 293, CPC.
128 e 460. Questão de ordem pública.
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terça-feira, 10 de setembro de 2013

PRINCÍPIO DA INVESTIDURA

De acordo com esse princípio a jurisdição deve ser exercida por quem tenha sido devidamente investido na função jurisdicional.

A investidura normalmente se dá por concurso, mas também pode se dar por nomeação do Presidente da República (Ministros do STF e do STJ), por nomeação do Governador do Estado e pode ser por convenção de arbitragem para aquele caso concreto. Mas a convenção de arbitragem é investidura para um caso. O árbitro só é juiz de paz ou de direito se for constituído como árbitro, não é porque fez curso de arbitragem ou porque comprou uma carteira preta com brasão dourado no camelô.

PRINCÍPIO DA INDELEGABILIDADE

A jurisdição é indelegável. O órgão jurisdicional não pode delegar a ouro o exercício da jurisdição. Um juiz não pode delegar ao estagiário a elaboração da sentença. E porque rigorosamente ele não pode, ele tem que assinar a sentença porque, para todos os efeitos, a sentença quem deu foi ele. Rigorosamente, os assessores não poderiam fazer o que fazem. Isso é o básico.

O juiz quando exerce a jurisdição tem vários poderes, o poder de conduzir o processo (fazer o processo andar), de produzir prova (instrutório), de decidir e o poder de executar. Rigorosamente, indelegável, é apenas o poder decisório. A CF, no seu art. 93, XIV, autoriza expressamente que o juiz delegue a servidores a prática de atos não decisórios, a prática de atos de administração e atos mero expediente de caráter decisório (atos de condução do processo). O CPC também tem essa previsão: Art. 162, § 4.º.

"XIV – os servidores receberão delegação para a prática a de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório.”
                                            
Os tribunais podem delegar a juízes de primeira instância o poder instrutório e de execução. O STF tem que executar a sua decisão, mas pode delegar isso para um juiz federal ou um juiz estadual. O juiz pode produzir provas para o STF. O poder instrutório e o poder executivo também podem ser delegados, embora seja delegado a outros órgãos jurisdicionais, não é o servidor. Isso porque o servidor só pode receber poder não decisório, poder de condução do processo. Poder instrutório e poder de execução pode ser delegado a outro órgão jurisdicional, no caso, os tribunais. Os tribunais podem delegar aos juízes de primeira instância o poder instrutório e o poder de executar.

É preciso entender o princípio da indelegabilidade de uma forma mais ampla, compreender essas nuances. A regra é que não se pode delegar poder decisório.

PRINCÍPIO DA INEVITABILIDADE

O que significa dizer que a jurisdição é inevitável? Significa que não se pode fugir dos efeitos da jurisdição. Ninguém pode evitar esses efeitos. Não se pode escapar a ela. A jurisdição é ato de império. É inevitável que se sofra as conseqüências dele. Sentença absurda: transita em julgado. Se você não concorda com a decisão, recorra. Se não recorrer, vai sofrer as conseqüências disso. 

PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE

A jurisdição se exerce sempre sobre um dado território. Há sempre uma limitação territorial, maior ou menor. O STF, por exemplo, exerce jurisdição em todo território nacional. Um tribunal de Estado exerce jurisdição em todo Estado. Um TRF exerce jurisdição em uma região, que abrange mais de um Estado.

            Nomenclatura da Justiça Estadual:

·      Comarca – Nome que se dá à unidade territorial da Justiça Estadual. É uma fração do território sobre a qual se exerce jurisdição na justiça estadual.
·         Distrito – Algumas comarcas se subdividem em distritos. Em algumas ainda há distritos, em outras já não há mais subdivisão territorial da comarca.

A regra é que a Comarca seja uma cidade e um distrito seja um bairro ou bairros desta cidade. Por que é a regra? Porque pode ser que em algum Estado do Brasil, cidades menores sejam distritos. Às vezes acontece de um distrito ser uma pequena cidade, mas o normal é que a comarca seja cidade e o distrito seja um bairro ou um conjunto de bairros.

            Nomenclatura da Justiça Federal:

·    Seção Judiciária – Na Justiça Federal o nome dado à “comarca” é Seção Judiciária.
·         Subseção Judiciária – É a subdivisão da Seção Judiciária.

            Já na Justiça Federal, a Seção Judiciária é sempre um Estado e a Subseção Judiciária é sempre uma cidade.

·         Foro – É território de jurisdição. Qualquer território de jurisdição se chama foro. Pode ser uma comarca, pode ser um distrito, pode ser uma seção, uma subseção.
·         Entrância – É o estágio da Magistratura, da carreira: 1ª entrância (começo da carreira), 2ª entrância, em alguns Estados há Entrância Especial e depois vai para o tribunal. Tem a ver com nível ou estágio na carreira funcional.

A regra é que o juiz exerça jurisdição em seu território. Maior ou menor, mas em seu território. Quanto a isso, há duas regrinhas que merecem atenção especial.

a)      1ª Regra – A do art. 230, do CPC que diz que o oficial de justiça de uma comarca pode sair de sua comarca e ir para outra comarca e lá praticar um ato processual. Isso, desde que esse ato processual seja um ato de comunicação processual. O oficial de justiça pode sair de sua comarca para fazer uma citação, uma intimação (sempre ato de comunicação) e desde que essa outra comarca seja fronteiriça (contígua) ou da mesma região metropolitana – esta é uma regra especial porque revela uma extraterritorialidade. O juiz exerce seu poder para além do seu território. É uma exceção, mas uma exceção razoável. Imagine-se um processo em SP para alguém ser citado em Guarulhos necessitar expedir carta precatória.

b)      2ª Regra – Imagine-se um terreno que está em duas comarcas. Isso acontece muito. É proposta no fórum da comarca A, uma ação envolvendo o imóvel X. Mas o imóvel X também está na comarca B. A jurisdição de A se estende por todo o imóvel. Quando A for julgar essa causa, exercerá sua jurisdição sobre todo o imóvel, inclusive sobre a parte do imóvel que está na comarca B. O legislador criou mais uma regra de extraterritorialidade. Art. 107, do CPC: “Se o imóvel se achar situado em mais de um estado ou comarca, determinar-se-á o foro pela prevenção, estendendo-se a competência pela totalidade do imóvel.”

            Uma coisa é saber onde a decisão tem que ser proferida (se é em Salvador, em Brasília, em Porto Alegre), outra coisa é saber onde a decisão vai produzir efeitos porque ela vai produzir efeitos muito além do lugar onde foi proferida. Os efeitos da decisão não se restringem ao lugar onde foi proferida. O divórcio proferido em Salvador vale para SP. O casal não está casado em SP. Imagine-se se fosse preciso entrar com divórcio em cada lugar do país. Uma sentença condenatória proferida em Curitiba vai poder ser cumprida na Bahia porque ela vai produzir efeitos onde tiver que produzir efeitos. Sentença de juiz brasileiro pode produzir efeitos em qualquer local do Brasil e ainda pode produzir efeitos no Japão, basta que se pegue a sentença do Juiz brasileiro, leve ao Japão e lá homologue. E vice-versa. Uma sentença de um juiz japonês pode produzir efeitos no Brasil desde que homologada aqui. E uma vez homologada aqui, produzirá efeitos em todo o território nacional.

            A Lei de Ação Civil Pública, Lei 7.347/85, no seu art. 16 diz que a sentença na ação civil pública só produz efeitos nos limites do território do órgão prolator da decisão. O que é um dispositivo bizarro. Uma das maiores excrescências da legislação brasileira. Isso significa que um juiz em Salvador julga uma ACP que em Vitória da Conquista não produz efeitos. O dispositivo é uma aberração. Foi criado para aniquilar a ACP. Por que aniquilar? Porque assim se teria que entrar com uma ACP em cada comarca. É talvez o dispositivo mais criticado da legislação processual civil brasileira. Fredie Didier acha um escândalo de inconstitucionalidade pela absoluta irrazoabilidade. É a corrente que Fredie Didier adota e a corrente que o MP adota. Quem vai fazer concurso para o MP, tem que saber que, se existe um culpado, esse culpado é o art. 16. Só que esse artigo é aplicado pelo STJ e a AGU adora esse artigo. Você terá que louvar ou esculhambar esse artigo a depender do concurso que você faça, sendo que do ponto de vista doutrinário é um horror. Por que o STF aplica? Porque isso é uma forma de se controlar o poder do juiz. Imagine-se um juiz numa cidade pequena do país, julgando uma ACP que vale para o país todo. Há alguns anos, quando um juiz de Cuiabá determinou que a União revistasse todos os americanos que chegassem ao Brasil porque era isso que estava sendo feito lá com os brasileiros (princípio da reciprocidade). Foi o caos. E isso foi um juiz de Cuiabá. Talvez nem tenha vôo de Cuiabá para Miami. Onde houvesse União + americano entrando no Brasil, teria que ter essa revista. Um juiz de Cuiabá decide e isso repercute no RJ? Sim, porque a ordem foi: “União, onde você vir um americano chegando, reviste!”

            Se um juiz de Salvador julga uma ACP pode levá-la para Inglaterra e homologá-la em toda a Inglaterra, mas não vale aqui. Nelson Néri diz: a sentença de um juiz brasileiro pode produzir efeitos na Sibéria, mas não pode produzir efeitos na comarca do lado. Então, a solução seria levar essa sentença para o STJ homologar, fazendo de conta que é uma sentença estrangeira. É uma regra ridícula e absurda. Fica essa ponderação sobre o art. 16.

PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL

O princípio do juiz natural é aquele que garante que todos serão processados e julgados por juiz competente e imparcial. Todas as regras infraconstitucionais que visam estabelecer a competência e a imparcialidade são regras que fazem valer o princípio do juiz natural.

            O que significa dizer que a todos é garantido um juiz competente? Essa garantia de que o juiz tem que ser competente para julgar a nossa causa está relacionada ao mérito. Isso por causa do seguinte: o juiz tem que ser competente de acordo com critérios prévios e gerais de competência. Ele tem que ser competente de acordo com os critérios estabelecidos pela lei. É a lei que determina a competência do juiz e o critério da lei tem que ser geral, por regras gerais, abstratas, que valham para todos.

             Acontece no Brasil um absoluto desrespeito desse princípio. E é um desrespeito escondido, dissimulado. O Presidente do Tribunal baixa uma portaria dizendo que designa o juiz tal para julgar a causa tal. Ora, isso é violar o princípio do juiz natural porque o juiz da causa tal tem que ser o juiz competente de acordo com regras legais estabelecidas e não por decisão do Presidente do Tribunal. Não é ele que escolhe o juiz da causa. A garantia do juiz natural impede a escolha do juiz da causa que tem que ser aquele estabelecido em lei como competente e não aquele escolhido pelas partes ou pela autoridade do Judiciário. Por isso, existem regras de distribuição dos processos, que são distribuídos para isso. Você vai ao distribuidor para sortear qual vai ser o Juízo para que não se escolha o Juízo e, assim, garantir a imparcialidade. O juiz não pode ser designado para uma causa.

            Também protege o juiz natural o fato de que o juiz não pode escolher a sua competência. Ele não julga o que ele quer. As regras de competência são legais e são indisponíveis. Não pode o juiz delas dispor (princípio da indisponibilidade da competência). Isso é uma garantia do juiz natural.

            O juiz natural não pode ser um tribunal de exceção. O que é isso? É um órgão jurisdicional criado para exclusivamente para julgar um determinado caso, para julgar determinado conflito. Surge um conflito e se cria um órgão jurisdicional para julgar aquele conflito. Isso viola o juiz natural que garante que todos serão julgados por um tribunal já constituído. Se eu crio um juízo de exceção, crio juízo extraordinário só para julgar determinada causa. Por isso que se diz que o princípio do juiz natural impede a constituição do juiz depois do fato. O juiz extraordinário, o tribunal de exceção, o juiz constituído depois do fato, ferem o princípio do juiz natural.

            O princípio do juiz natural não tem previsão literal na Constituição. Você retira o juiz natural de dois incisos do art. 5º, da CF, o XXXVII e o LIII.

     “XXXVII – Não haverá juízo ou tribunal de exceção.”
      “LIII – Ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente.”

            Esses dois incisos somados garantem o juiz natural.


            Caso interessante da jurisprudência do Supremo e que demonstra até onde o princípio do juiz natural pode ir: Quando o Estado de Roraima foi criado pela CF/88, os juízes que atuavam no então Território de Roraima eram juízes do DF, tanto que o TJ do Distrito Federal recebe o nome de Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Mas o Estado foi criado e o tribunal precisava ser criado e veio antes dos juízes. Foi constituído um tribunal com 7 desembargadores. Veio o concurso. Feito isso, apareceu uma ação popular contra ato do TJ de Roraima. Quem iria julgar essa ação? O juiz que tinha acabado de passar no concurso e que ainda não era vitalício. Ele teria que julgar um ato do tribunal ao qual estava vinculado administrativamente, sem nenhuma das garantias da magistratura. O STF entendeu que como nenhum juiz era vitalício, em Roraima não havia, então, juiz natural. Por quê? Porque não havia quem pudesse julgar de maneira imparcial a causa, sem as pressões que porventura pudessem acontecer. Não havendo juízes competentes, o STF julgou a causa: Reclamação 417, julgada em 1993, Carlos Velloso é o relator.

domingo, 8 de setembro de 2013

EQUIVALENTES JURISDICIONAIS

Regra geral, a solução de conflitos jurídicos concretos se dará no âmbito jurisdicional, ou seja, sob a tutela estatal. Há, porém, situações em que se excepciona tal regra. Essas situações são solucionada por meio dos chamados Equivalentes Jurisdicionais. Quais são essas situações? São 4 ao todo, divididas em dois grupos:

a) situações autônomas de solução de conflitos (autocomposição e autotutela); e

b) situações heterônomas de solução de conflitos (mediação e arbitragem).

SITUAÇÕES AUTÔNOMAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS:
As situações autônomas são aquelas em que não há a intervenção de uma terceira pessoa, estranha ao caso, na(o) condução/auxílio para a resolução da celeuma.
São duas ao todo: i) autotutela; e ii) autocomposição.

a-i) Autotutela: a autotutela ocorre quando se impões com as próprias forças o direito que se tem, ou se imagina ter. Em regra, a autotutela constitui crime tipificado no art. 345 do Código Penal. É o chamado exercício arbitrário das próprias razões. Veja: "Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena - detenção, de 15 (quinze) dias a 1 (um) mês, ou multa, além da pena correspondente à violência."

Há, no entanto, 4 exceções onde a autotutela não constitui crime, quais sejam:
- Legítima defesa pessoal;
- Legítima defesa da posse;
- Direito de retenção; e
- Direito de greve.

a-ii) Autocomposição: ocorre quando as próprias partes envolvidas no conflito, de comum acordo, resolvem a questão por meio de renúncia/concessão recíproca - que é o que acontece com a transação (espécie de conciliação em que há concessão recíproca) - ou por meio de renúncia/concessão unilateral, ambos os casos sem a necessária intervenção de um terceiro mediador/conciliador.

SITUAÇÕES HETERÔNOMAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS:
Tais situações ocorrem quando, de fato, há a necessária intervenção de um terceiro para a solução do conflito entre as partes. São duas: i) mediação; e ii) arbitragem.

b-i) Mediação: nessa situação o terceiro apenas auxilia as partes a chegarem a um acordo, a uma solução. É um facilitador, apenas. Ele não decide nada.

b-ii) Arbitragem: na arbitragem há um acordo entre as partes para a eleição de um árbitro que deverá decidir o conflito futuro ou já em voga. Trata-se de um negócio jurídico realizado, em tese, com autonomia da vontade, o que faz lei entre as partes.

A fonte da arbitragem é a CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM – nome do negócio jurídico em que as partes optam pela solução através de um árbitro. É um gênero negocial que compõe duas espécies:

Cláusula compromissória – é uma convenção de arbitragem prévia, pela qual as partes decidem que se sobrevier um conflito relativo àquele negócio jurídico que acabou de ser celebrado, esse conflito deverá ser resolvido pelo árbitro. Exemplo: contrato de sociedade: no final do contrato estabelece: “eventual discussão sobre os termos deste contrato deverá ser resolvida por árbitro.” A cláusula compromissória é indeterminada. É para o futuro. Se sobrevier o conflito, esse conflito deverá ser resolvido por árbitro. As partes se antecipam ao conflito e dizem que se sobrevier o conflito relativo a determinado negócio, esse conflito deverá ser resolvido por arbitragem. É o que costumam fazer as grandes empresas hoje. É cláusula muito aberta e recente novidade. Foi incorporada em nosso direito em 1996. O juiz pode conhecer de ofício cláusula compromissória. Não pode conhecer de ofício compromisso arbitral.

Compromisso arbitral – o compromisso arbitral pressupõe um conflito já existente. Já existe um conflito instaurado e as partes resolvem que aquele conflito deve ser resolvido por árbitros. O compromisso arbitral, porque sempre se refere a um conflito concreto, pode ser precedido de uma cláusula compromissória. Feita a cláusula compromissória, caso o conflito apareça, vai ser necessário regulamentar a arbitragem. O conflito apareceu e as partes já sabem que aquele conflito deverá ser resolvido por árbitro. Mas não sabem ainda quais serão as regras da arbitragem (quem vai ser o árbitro, qual o tempo da arbitragem, o que vai gastar com isso) e que foi decidida antes pela cláusula compromissória. Quando o conflito surge, será preciso definir o modelo da arbitragem. Porque a arbitragem seguirá o que as partes decidirem. O processo da arbitragem obedece ao que as partes quiserem. São os sujeitos envolvidos que vão estabelecer as regras do processo arbitral: quem vai ser o árbitro, quanto ele vai ganhar, quais serão os prazos. Pode ser que o compromisso arbitral sirva como uma forma de concretização da cláusula compromissória. É possível que haja compromisso arbitral sem prévia cláusula compromissória. Exemplo: Acidente de trânsito: podem as partes fazer um compromisso arbitral na hora, surgido, pois, do conflito. O juiz pode conhecer de ofício cláusula compromissória. Não pode conhecer de ofício compromisso arbitral.

Quem pode optar pela arbitragem – Não é todo mundo que pode fazer arbitragem. Pela lei de arbitragem, só pessoas capazes podem porque, ao escolher a arbitragem, está-se abrindo mão da jurisdição estatal.

Arbitragem é inconstitucional? – A arbitragem não seria inconstitucional, porque estaria tirando do Judiciário alguma questão. A arbitragem não é inconstitucional porque não é compulsória. Se a arbitragem fosse compulsória, seria inconstitucional porque você não pode ser obrigado a não ir ao Judiciário. Por outro lado, ninguém pode ser obrigado a demandar. Eu, pessoa livre, capaz, posso optar por levar o meu problema a um árbitro para que ele decida.

Arbitragem e direito público - Há dez anos, o Brasil passou por uma grande transformação do ponto de vista do direito administrativo. E uma dessas transformações é que agora temos um Estado regulador, com agências reguladoras, com economia mais aberta, etc. E as leis que descentralizam a atividade econômica há sempre a previsão de arbitragem envolvendo entes públicos, em alguns negócios. Em parcerias público-privadas a arbitragem é prevista. Então, não fique pensando que a arbitragem fica restrita às questões eminentemente privadas. Mesmo no âmbito do direito público, já se fala em arbitragem. Há hoje inúmeras hipóteses de arbitragem no direito público. A arbitragem no direito do trabalho tem previsão constitucional.

Objeto da arbitragem – O objeto da arbitragem não pode ser qualquer direito. Somente direitos disponíveis. E aqui convém entender direitos disponíveis como aqueles que admitem conciliação.

O SISTEMA da ARBITRAGEM no BRASIL

No direito brasileiro o árbitro escolhido pelas partes é juiz de fato e de direito. Importante essa observação porque um árbitro que, por exemplo, receba dinheiro por fora, pratica corrupção porque, mesmo sendo um cidadão comum, mesmo estando no âmbito particular, naquele caso, ele é juiz porque, pela lei de arbitragem, ao exercer as funções de arbitragem, o árbitro é juiz.

O que há de mais complexo em tema de arbitragem no Brasil é saber qual é a posição do judiciário estatal em face das decisões do árbitro. O que o juiz estatal pode e o que ele não pode fazer em relação à decisão arbitral. É preciso aprender a relacionar a decisão do árbitro com a decisão do juiz estatal.

No nosso sistema, a sentença arbitral é título executivo judicial. Isso significa que com a sentença arbitral é possível partir para a execução. É como se tivesse se originado de um juízo estatal. O árbitro não pode executar as suas decisões. Ele apenas pode certificar direitos. A execução das suas decisões sempre será feita pelo juiz estatal. O árbitro decide, mas não executa. Em relação à sentença arbitral o juiz estatal a executa, a cumpre, a efetiva. Essa circunstância, para Marinoni, revela que o árbitro não é juiz e não exerce jurisdição. Tanto não exerce jurisdição que não pode efetivar as suas decisões.

Para Fredie Didier esse não é um argumento correto. Poder ou não poder executar a decisão é um problema de competência. Um tribunal julga a apelação e não executa a decisão. Quem executa é o juiz a quo. O juiz penal condena, mas quem executa é o juiz da Vara de Execuções Penais. Então, atribuir a outro juízo a execução não torna o primeiro juiz não juiz. Não é porque o outro Juízo executa, que o primeiro não é juiz. Daí Fredie Didier  entender que o argumento de Marinoni não é bom.

Outro ponto polêmico que intriga Didier é o seguinte: se o árbitro decide, o Judiciário não pode rever a decisão do árbitro. O Judiciário não pode dizer que o árbitro errou, que é injusta. A decisão do árbitro não se submete a um controle de mérito pelo Judiciário. Contudo, o Judiciário, diante da sentença arbitral, pode invalidá-la, o que é muito diferente. Se a sentença tiver algum defeito, não for fundamentada, o árbitro é corrupto, não se respeitou o contraditório, é possível anulá-la em juízo. Eu não posso ir ao Judiciário para que o juiz dê uma nova decisão a respeito. O Judiciário simplesmente pode anular para que outro árbitro decida.

A alegação em juízo do compromisso arbitral ou de decisão arbitral não se faz por preliminar de mérito, mas por preliminar processual.

A invalidação da decisão arbitral pode ser pleiteada pelo prazo de 90 dias, contados da intimação da decisão para a parte propor uma ação de nulidade da sentença arbitral. Essa ação é o equivalente à ação rescisória de sentença, com a diferença que o prazo é de 90 dias e não 2 anos e essa anulatória é só por questão de nulidade. Então, ultrapassados esses 90 dias, a sentença arbitral é definitiva.

Caso concreto: foi celebrada convenção de arbitragem. Surgiu um problema e uma das partes já demandou no Judiciário. Se ele demanda no Judiciário havendo convenção de arbitragem, está errado. O réu tem que alegar, em defesa, convenção de arbitragem - "Juiz, você não pode examinar porque há entre nós uma convenção de arbitragem". O juiz extingue o processo sem resolução de mérito.


Vai que o réu não alega nada. O autor demandou indevidamente no Judiciário, o réu se defendeu mas não alegou a convenção de arbitragem. Essa não alegação também é uma manifestação de vontade que se soma à manifestação de vontade do autor que demandou no Judiciário. Se os dois aceitaram ir para o Judiciário, revogada a cláusula compromissória. Da mesma forma que eles fizeram a cláusula, podem revogá-la depois. São livres. Ambos, livremente, descumpriram a cláusula. Se ambos descumpriram, significa que não estão mais a fim dela. Perderam a vontade. Não tem problema algum. Se o réu não alegar, haverá revogação. Aconteceu isso uma vez. O réu alegou a convenção de arbitragem e reconveio. Ao reconvir, ele está demandando no Judiciário de novo. O juiz entendeu que, ao reconvir, ele aceitou a jurisdição estatal.